Ela caminhou e deitou novamente...a maneira com que desfilava por entre as frestas da janela não deixava nenhuma dúvida em quem passava.
Pegou em um de seus cachos vermelhos e observando a luz contínua que saía por detrás do espelho,dormiu. Dormiu por um tempo que ela nem ousou calcular.
Ouvindo o som dos passáros que já haviam ido embora fazia tempo, o tic tac do relógio que permanecia parado, e as batidas de seu
coração, impregnadas e focadas em alguma coisa sem sentido, mas muitas coisas sem sentido, no final...fazem sentido.
Ela acordou, sem querer acordar, tentou dormir novamente...mas não havia mais lugar para tal, não havia mais lugar para sonhos naquele quarto.
Enquanto a fitavam do lado de fora, ela fugia de todos os espelhos que ali a circundavam. Trezentos e sesssenta graus de si mesma, trezentos
e sessenta graus de convivencia diária, semanal, mensal...consigo mesma, trezentos e sessenta graus do seu olhar que não permetia mais se fixar em nada.
Ela começou a ouvir murmúrios, susurros...e com o tempo, isso foi ficando mais claro e ela já podia entender o que falavam.
-Quem se enclausura, não deixa de sonhar...faz do seu sonho a realidade e não percebe que as portas vão se fechando ao seu redor. Toda vez que seus
olhos descansam, o mundo é esquecido e vendado por eles.
-Olhe para dentro...para aprendermos a nos conhecer por dentro devemos olhar nossa imagem no espelho.Devemos perder a noção do tempo,
mas tendo a noção de que isso, está sendo feito...não durma lindo anjo de cabelos vermelhos, seu sono ingrato não lhe tirará do seu quarto escuro,
só você tem a chave,as pessoas lhe observam enquanto você tenta fugir delas, tudo está a espreita...tudo acaba nos espreitando, no final.
Ela perguntou:
- Mas há um final?Quando sabemos que o final chegou?
A voz lhe respondeu:
-Você saberá... eu não quero ter que dizer,as palavras queimam meus lábios. Prefiro te olhar e deixar que voce descubra a ter que falar com
as sombras do passado, a ter que falar com seu passado.
A voz preferia olhar ...nossos olhos são mais sábios, eles não pensam.
Quanto mais as frestas das janelas eram abertas, mais as pessoas paravam de espreitá-la...
Seus cachos foram adquirindo sua cor natural, loiros como o sol que agora, ela permitia entrar, mesmo que esporadicamente...
Ela já não sangrava mais em todo lugar. Seus trapos foram sendo retirados, aos poucos, dia após dia.
A voz dentro dela. Melhor ficar nua...do que usar uma roupa rasgada. Com o tempo, peça a peça será conquistada.
O sorriso necessita de tempo, do nosso tempo...sem ele.